Xingu

Joana Martins, Ana Luiza Nobre e David Sperling

MT, Brasil

11°52'21" oeste e 53°30'37" sul.

Primeira terra indígena demarcada no Brasil, no ano seguinte à inauguração de Brasília.

Publicado em
20/10/2022

Atualizado em
02/12/2022

Em meio às áreas de pastagem e às monoculturas que retalham a terra, uma faixa verde se destaca com contornos bem definidos. Aí, tudo que se vê pelas imagens de satélite são algumas clareiras circulares e o curso dos rios. É o território do Xingu, uma área entre o cerrado brasileiro e a floresta amazônica de mais 26 milhões de hectares – quase três vezes o território de Portugal.

Cerca de 10% dessa área corresponde à primeira terra indígena homologada no Brasil: o Parque Indígena do Xingu, cuja origem data da década de 1940, com a “Marcha para o Oeste” criada pelo governo de Getúlio Vargas. Foi então que três irmãos sertanistas, Orlando, Cláudio e Leonardo Villas Bôas, saíram de São Paulo na Expedição Roncador-Xingu com a missão de colonizar novos territórios. Ao se encontrarem com os indígenas que habitavam o interior do país, porém, contrariaram o caráter militarista da expedição e começaram uma longa luta em defesa da soberania dos povos que lá estavam, da qual participaram vários outros atores.

A solução estratégica foi realocar alguns povos, concentrando todos num território só. Assim foi criado em 1961 o Parque Indígena do Xingu, uma inovadora área de proteção e, ao mesmo tempo, um enclave que circunscreveu diversas etnias distintas em área menor que seu território tradicional e liberou tudo que estava fora de seu perímetro para a colonização e o extrativismo – inclusive as cabeceiras dos rios que desaguam no Xingu. O projeto foi redigido pelo antropólogo Darcy Ribeiro, então vinculado ao Serviço de Proteção ao Índio.

A Expedição Roncador-Xingu abriu 19 campos de pouso, 4 bases militares e fincou 6 marcos geodésicos no interior do país, o que contribuiu para fomentar práticas agrícolas e de mineração altamente predatórias, para atender às demandas do mercado internacional de matérias-primas, hoje chamadas de commodities. Só em 2020, 13 municípios no entorno do Xingu exportaram 17 milhões de grãos de soja e milho – em sua maior parte para a China, graças à atuação de gigantes do agronegócio global como Burge, Cargill e Cofco. Enquanto as taxas de desmatamento aumentam e a fronteira agrícola avança sobre a bacia do Xingu,  os indígenas lutam agora pela demarcação de áreas contíguas ao Parque, que totalizam 21 terras indígenas e 9 unidades de conservação, onde vivem mais de 17.000 pessoas e 26 povos indígenas.

O Parque não é aberto a visitação. Mas não faltam pacotes promovendo o etnoturismo no município vizinho de Feliz Natal.

Trecho do rio Xingú seco devido à construção da usina hidrelétrica de Belo Monte. Foto: Lalo de Almeida/Folhapress.(1)

Trecho do rio Xingú seco devido à construção da usina hidrelétrica de Belo Monte. Foto: Lalo de Almeida/Folhapress.(1)

Orlando Villas Bôas medicando indígena do povo Kaiapó Metuktire, em 1965 no Pará. (2)

Orlando Villas Bôas medicando indígena do povo Kaiapó Metuktire, em 1965 no Pará. (2)

Foto: Nelson Jr./SCO/STF. (3)

Foto: Nelson Jr./SCO/STF. (3)