Terreiro da Casa Branca do Engenho Velho
Joana Martins, Ana Luiza Nobre e David Sperling
BA, Brasil
12°59'49" oeste e 38°29'41" sul.
Publicado em
13/09/2022
Atualizado em
13/09/2022
Um terreiro nasce da experiência do desterro e da transgressão da lógica colonial, como reinvenção da possibilidade de sobrevivência. Em suas muitas possibilidades de configuração, é difícil enquadra-lo numa definição única. Mas sem dúvida a mais recorrente delas passa pela relação com o chão nas práticas ritualísticas do candomblé.
O Terreiro Casa Branca do Engenho Velho (ou, em iorubá, Ilê Axé Iyá Nassô Oká), fundado na década de 1830, é considerado o mais antigo do Brasil. A área verde em encosta no bairro do Engenho Velho da Federação, em Salvador, Bahia, é protegida por Oxossi, orixá das matas. A arquitetura é protegida por Xangô, orixá da justiça. Uma bandeira branca hasteada, os altares espalhados e as plantas de axé indicam logo que se está em território encantado.
Ilê Axé Iyá Nassô Oká significa “casa de mãe Nassô” em iorubá. Como contam os mais velhos, Nassô e outras duas africanas da nação nagô, oriundas dos reinos de Oió e Ketu, fundaram o terreiro nos arredores da Igreja da Barroquinha, na região central de Salvador. Mas o recrudescimento da repressão à cultura africana que se seguiu à Revolta dos Malês (1835) forçou sua transferência para o subúrbio da cidade, como aconteceria com muitos outros terreiros, sobretudo depois que as religiões de matriz africana foram proibidas em 1890, por serem associadas à feitiçaria e ao charlatanismo.
Em 1976, quando um decreto estadual livrou o candomblé na Bahia da perseguição policial, iniciou-se um movimento contra as invasões ao terreno da Casa Branca por um posto de gasolina. Dessa disputa surgiu a ideia, até então inédita, de proteger o terreiro como patrimônio, livrando-o da lógica mercadológica e especulativa vigente. Em 1982, o terreiro foi reconhecido como patrimônio da cidade de Salvador e quatro anos depois foi tombado pelo Sphan (atual IPHAN) como o primeiro monumento negro a ser reconhecido e preservado no Brasil.
O tombamento inédito das construções simples da Casa Branca, sua vegetação e seu território indicou uma mudança na própria concepção de patrimônio nacional, que até então privilegiava a materialidade da arquitetura colonial, luso-brasileira. Também abriu caminho para o reconhecimento da importância da cultura africana na formação simbólica e imaginária brasileira – o que desencadeou outros tombamentos e mecanismos de proteção para terreiros, nos anos seguintes.
Do chão potente da Casa Branca também brotaram outros terreiros/mundos, como os terreiros do Gantois e do Axé Opô Afonjá.
Festas da Casa Branca
Documentário Atlântico Negro: na rota dos orixás
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Referências
ARAÚJO, Rebecca. IPHAN tomba Terreiro da Casa Branca. Disponível em: http://www.cronologiadourbanismo.ufba.br/apresentacao.php?idVerbete=1594. Acesso em: 16 jun. 2022.
CANTARINO, Carolina. Quando os deuses se materializam. Disponível em: http://www.labjor.unicamp.br/patrimonio/materia.php?id=44. Acesso em: 16 jun. 2022.
CASTILLO, Lisa Earl. Iyá Nassô e as origens do Terreiro da Casa Branca. Disponível em: https://www.salvadorescravista.com/lugares-de-mem%C3%B3ria/terreiro-da-casa-branca. Acesso em: 16 jun. 2022.
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IPHAN. Terreiro Casa Branca do Engenho Velho - Salvador (BA). Disponível em: http://portal.iphan.gov.br/pagina/detalhes/1636/. Acesso em: 16 jun. 2022.
PORTAL GELEDÉS. Casa Branca do Engenho Velho. 2009. Disponível em: https://www.geledes.org.br/casa-branca-do-engenho-velho/. Acesso em: 16 jun. 2022.
SERRA, Ordep. Ilê Axé Iyá Nassô Oká/Terreiro da Casa Branca do Engenho Velho - Laudo Antropológico de autoria do professor doutor Ordep José Trindade Serra da Universidade Federal da Bahia. 2008. Disponível em: http://ordepserra.files.wordpress.com/2008/09/laudo-casa-branca.pdf. Acesso em: 16 jun. 2022.
Fonte das Imagens
Imagem 1: https://atarde.com.br/bahia/bahiasalvador/tombamento-da-casa-branca-completa-30-anos-601717
Imagem 2: https://www.salvadorescravista.com/lugares-de-mem%C3%B3ria/terreiro-da-casa-branca
Imagem 3: https://docplayer.com.br/21768953-Feitico-de-oxum-um-estudo-sobre-o-ile-axe-iya-nasso-oka-e-suas-relacoes-em-rede-com-outros-terreiros.html