Pinheiro de Ouro

Ana Carolina Bezerra e David Sperling

SP, Brasil

22°6'0" oeste e 47°50'48" sul.

“Do cultivo dos pinhões também a tribu expatriada não se abstinha: - seguindo desta cidade a do Rio-Claro, pela via-férrea, o observador curioso e attento verá, á direita, 3 ou 4 minutos depois da estação da Colônia, um pinheiral vetusto, plantado logo além de um cafezal, por entre o arvoredo da matta. Encontraram-no alli os primeiros conhecedores do terreno.” (Cincinato Cesar da Silva Braga, deputado provincial por São Carlos do Pinhal, 1894)

Publicado em
22/11/2023

Atualizado em
08/01/2024

A semente encontrou um solo fértil e favorável para o seu desenvolvimento após chegar na região pelas mãos nômades de povos indígenas, sejam eles guaianás, tupis ou jê, como levantam diferentes estudos e registros históricos. De semente em semente formaram-se bosques de araucárias (Araucaria angustifolia), que cresciam no relevo acidentado, em seus pontos altos. O chão não é passivo, nutre e permite que ali floresça. Constrói-se assim uma relação de mutualismo entre o povo originário e a natureza enraizada e agora íntima daquela rica terra. Assim viviam: da caça, cultivo e colheita, principalmente do pinhão, sendo conhecedores de inúmeras formas de consumo e conservação.
Nessa terra assim viveram até o final do século XVIII. Após a invasão de colonos, abriram-se caminhos em direção ao ouro no interior do Brasil. O elo entre araucárias e indígenas perece,  expulsa-se e dizima-se uma nação inteira. 
A narrativa histórica que permite associar o plantio de pinheiros à ação dos povos indígenas foi documentada apenas no final do século XIX. Uma descoberta arqueológica de cerâmicas foi feita próxima à estação Colônia, atual Conde do Pinhal, durante a construção do trecho da estrada de ferro entre Rio Claro e São Carlos, onde ainda era possível apreciar uma antiga plantação de grandiosos pinheiros ali cultivados.
E é dessa herança deixada pelos indígenas que nasce em 1831 a Sesmaria do Pinhal, e a São Carlos do Pinhal em 1857. Praticamente um século depois das invasões, as tradições indígenas ainda se faziam presentes no simbolismo do pinheiro-brasileiro, estampado, posteriormente, no brasão e na bandeira são-carlense: o pinheiro de ouro, e não dos povos que o cultivavam. A narrativa colonial legitimada. 
Na memória da cidade a árvore permanece apenas como emblema que marca sua história, mas raramente encontra espaço em seu território. Pouco se vê de sua presença nas paisagens da São Carlos do Pinhal que cedeu sua terra roxa ao agro, começando sua devastação pela expansão das lavouras cafeeiras, já na época da fundação da cidade. 
Os fazendeiros que ergueram São Carlos assim o fizeram com seu novo ouro, o café. Com os anos, alguns remanescentes de araucárias ainda foram derrubados para uso comercial de sua madeira ou sofreram com queimadas criminosas da cana, o novo agro. 
Hoje, apenas alguns isolados sobrevivem sombreando pontos da cidade. Cada uma dessas araucárias ainda é o chão gravado pelos povos que aqui viveram.

Brasão de São Carlos e os 5 pinheiros de ouro. Foto: Fundação Pró-Memória de São Carlos (1)

Brasão de São Carlos e os 5 pinheiros de ouro. Foto: Fundação Pró-Memória de São Carlos (1)

Vestígio da história. Foto: Site Mapio Net Pic (2)

Vestígio da história. Foto: Site Mapio Net Pic (2)

 Estação Conde do Pinhal, inaugurada em 1884. Foto: Wilson Silva Jr. (3)

Estação Conde do Pinhal, inaugurada em 1884. Foto: Wilson Silva Jr. (3)

As sementes de São Carlos do Pinhal. Foto: Site Viajando em 321, Colhendo pinhão na serra (4)

As sementes de São Carlos do Pinhal. Foto: Site Viajando em 321, Colhendo pinhão na serra (4)