Pavilhão Carlos Lopes

Ana Luiza Nobre

Lisboa, Portugal

38°43'44" leste e 9°9'5" sul.

“Se quiserem acreditar, ótimo.” (Italo Calvino, As Cidades Invisíveis)

Publicado em
20/10/2022

Atualizado em
02/12/2022

Era uma vez um morro. Esse morro ficava junto ao mar. E encastelada no alto dele, brotou uma cidade. 

A vida corria ali no sobe-e-desce rotineiro entre casas e igrejas, muros, ladeiras e becos, árvores e vasos com plantas, praças e lençóis brancos estendidos em varais. 

Dizem que havia um tesouro enterrado sob tudo isso. E os mapas da cidade referiam-se a um castelo inexistente no alto do morro. 

Um dia a cidade decidiu modernizar-se e pôs o morro abaixo a jatos d’água. Toneladas de lama e entulho criaram um solo artificial conquistado ao mar. Sobre o imenso vazio abriu-se uma esplanada central onde instalou-se temporariamente uma exposição monumental, com ares de sonho. Países de todas as partes do mundo construíram ali pavilhões efêmeros para comemorar o centenário da Independência do país anfitrião, por séculos dominado por invasores ultramarinos. Em 10 meses, mais de 3 milhões de pessoas correram para ver as maravilhas expostas: máquinas industriais, obras de arte, tecidos, vestuário, café, cerveja, biscoitos e muito mais. Nesse imenso carrossel de fantasias, não faltou sequer um parque de diversões, um trenzinho e um cinema ao ar livre.

A data coincidia com celebrações análogas em países vizinhos, daí o estilo arquitetônico que predominou nos pavilhões e palácios nacionais e estrangeiros: uma espécie de colonial modernizado, contraditoriamente comprometido com o caráter nacional em exaltação.

Desde o outro lado do oceano, o pequeno país que havia dominado por séculos o gigantesco anfitrião enviou um pavilhão inteiro, desmontado. Os elementos construtivos refizeram de navio a rota transatlântica tantas vezes percorrida entre duas cidades portuárias que não muito antes haviam disputado a centralidade de um Império.

Depois da exposição, o pavilhão foi novamente desmontado e atravessou o oceano de volta, para ser reconstruído, peça por peça, num parque da cidade onde tudo começou. Quem passa por ali hoje talvez não se dê conta de que tem diante de si a imagem especular do país distante, cuja independência ainda está por ser desmontada.

Pavilhão Carlos Lopes, Lisboa. Foto: Diego Inglez de Souza, 2022.

Pavilhão Carlos Lopes, Lisboa. Foto: Diego Inglez de Souza, 2022.

Pavilhão Carlos Lopes, Lisboa. Foto: Diego Inglez de Souza, 2022.

Pavilhão Carlos Lopes, Lisboa. Foto: Diego Inglez de Souza, 2022.

Pavilhão de Portugal, Exposição Internacional do Rio de Janeiro, 1922. (1)

Pavilhão de Portugal, Exposição Internacional do Rio de Janeiro, 1922. (1)

Pavilhão Carlos Lopes, Lisboa. Foto: Diego Inglez de Souza, 2022.

Pavilhão Carlos Lopes, Lisboa. Foto: Diego Inglez de Souza, 2022.

Pavilhão Carlos Lopes, Lisboa. Foto: Diego Inglez de Souza, 2022.

Pavilhão Carlos Lopes, Lisboa. Foto: Diego Inglez de Souza, 2022.