Morro da Favela
Thaís Barcellos, Ana Luiza Nobre, David Sperling
Publicado em
30/09/2022
Atualizado em
02/12/2022
Finda a Guerra de Canudos, em 1897, a promessa feita aos ex-combatentes era de que receberiam terras como pagamento ao triunfo. Recém-chegados ao Rio de Janeiro, e sem o prometido, estabeleceram-se na região central da cidade, próxima à sede do Ministério da Guerra. Juntaram-se a ex-escravizados e soldados de baixa patente que já tinham sido expulsos de suas casas pelas ações higienistas das reformas de Pereira Passos.
“Assim, começaram a chamar de Favela, o Morro da Providência, não só em homenagem ao ponto estratégico que lhes possibilitou a vitória, como para estabelecer um paralelo irônico entre aquele e este, do qual, tal como na campanha, desciam todos os dias para a conquista de um novo obstáculo: a má vontade. Aqui também a fome e as privações castigam o corpo (e o coração) com a mesma intensidade da favela de Canudos.” (MEDINA, 1964 p.10)
Favela era a vegetação predominante no morro onde esses soldados combateram e acamparam em Canudos. Cnidoscolus phyllacanthus (Euphorbiaceae), planta espinhosa comum na caatinga, seu caule e folhas são cianogênicos, portanto, venenosos. Favela é o significante que se expandiu para nomear qualquer outra ocupação irregular e precária por aqueles que não encontram outro lugar.
O que era para ser passado está sempre presente na narrativa do Morro da Providência, como de outros morros, outras favelas: falsas promessas, desterramentos e busca por adaptação em um novo chão. Dentre tantas investidas, como não lembrar da construção dos teleféricos no alto dos morros, que os conectariam aos modais de transporte da cidade? Uma cidade que se constrói com a espessura de uma imagem e a duração de um evento – a cidade embelezada, antes como tragédia, em seguida como farsa.
Assumidos pelo estado como símbolos de ocupação de territórios informais, os teleféricos operaram por apenas cinco anos. Enquanto as cabines seguem penduradas, em suspensão, no céu dos morros, a favela é afirmação de luta, resistência e permanência.
Referências
LUCENA, Felipe. Dia da Favela: a história do Morro da Providência, a primeira de todas. Diário do Rio, Rio de Janeiro, 4, nov, 2021. Disponível em: https://diariodorio.com/dia-da-favela-a-historia-do-morro-da-providencia/ . Acesso em: 08/03/2022
MELLO, Carolina Braun de. Tecendo memórias e fotografias: dos sertões à favela. Dissertação (Mestrado em Memória social). Centro de Ciências Humanas e Sociais. Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, p. 104. 2019. Disponível em: http://www.memoriasocial.pro.br/documentos/Diss449.pdf. Acesso em: 09/03/2022
OLIVEIRA, Diego M. et al. Intoxicação por Cnidoscolus phyllacanthus (Euphorbiaceae) em caprinos. Pesq. Vet. Bras. 28 (1), Jan 2008. Disponível em: https://www.scielo.br/j/pvb/a/XW7QPPJCwzXV7vZjdfFSJCh/?lang=pt#. Acesso em 24 de agosto de 2022.
PEREIRA DE QUEIROZ FILHO, Alfredo. Sobre as origens da favela. Mercator - Revista de Geografia da UFC, vol. 10, núm. 23, set-dez, 2011, pp. 33-48, Universidade Federal do Ceará. Disponível em: https://www.redalyc.org/pdf/2736/273621468004.pdf . Acesso em 24 de agosto de 2022.
Fonte das Imagens
Imagem 1:
https://vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/03.032/714
Imagem 2:
https://diariodoporto.com.br/morro-da-providencia-vira-cartao-postal-com-a-rio-star/
Imagem 3:
http://literaturaeriodejaneiro.blogspot.com/2015/05/oratorio-do-morro-da-providencia.html
Imagem 4:
https://nema.univasf.edu.br/site/index.php?page=newspaper&record_id=31
Imagem 5:
https://agenciabrasil.ebc.com.br/cultura/noticia/2017-06/exposicao-traca-paralelo-entre-morro-da-providencia-e-guerra-de-canudos
Imagem 6:
https://vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/03.032/714
Imagem 7:
http://olerj.camara.leg.br/retratos-da-intervencao/favelas-cariocas