Jaraguá é Guarani

Joana Martins, Ana Luiza Nobre e David Sperling

SP, Brasil

23°26'35" oeste e 46°45'43" sul.

“Quando a gente fala de Yvyrupa, a concepção não é país, não é território. A concepção é a terra, como algo que é muito puro e sagrado, que não fomos nós que criamos. Não somos donos, mas fazemos parte dela. Divisão, território, delimitação e demarcação são invenções do não-indígena.” (David Karai Popygua, no vídeo YVYRUPA de 2017)

Publicado em
05/09/2022

Atualizado em
31/05/2023

A cidade de São Paulo, a mais rica, mais urbanizada e mais congestionada do Brasil, é também a que tem a quarta maior população indígena do país, segundo dados do IBGE. Os indígenas se concentram atualmente em duas terras demarcadas nos extremos da cidade, onde vive o povo Guarani Mbya: no Pico do Jaraguá, ao norte, e em Parelheiros, ao sul.

Apesar de sua cosmologia nômade e de originalmente ocuparem parte do que hoje nomeamos como Bolívia, Paraguai, Argentina, Uruguai e Brasil, a terra indígena do Jaraguá é a menor área demarcada do país. Possui 1,7 hectares desde 2017, quando a medida definida dois anos antes, com 532 hectares, foi revogada. Desde então, as aldeias guaranis Tekoa Ita Endy, Tekoa Itakupe, Tekoa Pyau e Tekoa Yvy Porã, que habitam a Reserva do Pico do Jaraguá, a oeste da Serra da Cantareira, intensificaram sua luta pela retomada de suas terras para além da pequena fatia que lhes resta entre estradas, rodovias e condomínios privados.

Em 2013, os Guarani bloquearam a rodovia Bandeirantes, importante estrada que parte do Rio Tietê em direção noroeste e homenageia os sertanistas que exterminaram e escravizaram indígenas nos séculos XVII e XVIII. A esse ato se somam outros tantos protestos realizados pelos indígenas na capital paulista, em defesa, principalmente, da ampliação da demarcação de suas terras. Sob o lema “Jaraguá é Guarani”, os indígenas já dançaram seu xondaro, picharam e estenderam faixas no Monumentos às Bandeiras, na Avenida Álvares Cabral, no Pátio do Colégio e no escritório da Presidência da República na Avenida Paulista.

Os guaranis dançaram no chão quente de asfalto das avenidas que cortam seu território. Dançaram por 6 horas no piso de mármore do saguão do edifício federal. E como estratégia de interferência na lógica branca, desligaram as antenas de telecomunicação da TV Bandeirantes, instaladas no Pico do Jaraguá, deixando 600 mil pessoas sem sinal.

Em 2020, em área vizinha à terra indígena, uma construtora iniciou obras de construção de moradias populares do programa Minha Casa, Minha Vida. Para “limpar o terreno”, derrubaram 500 árvores. Os guaranis ocuparam o terreno para viver o luto dessas árvores e fizeram o reflorestamento da área com 800 mudas nativas.

Os guarani querem ser vistos. Curiosamente, Jaraguá – ou “senhor dos vales”, em guarani – é o ponto mais alto da cidade de São Paulo, com 1135 metros de altitude.



Ocupação guarani no Pico do Jaraguá. Foto: Comissão Guarani Yvyrupa. (1)

Ocupação guarani no Pico do Jaraguá. Foto: Comissão Guarani Yvyrupa. (1)

Manifestação guarani contra o marco temporal e as demarcações. Foto: Eduardo Figueiredo / Mídia NINJA. (2)

Manifestação guarani contra o marco temporal e as demarcações. Foto: Eduardo Figueiredo / Mídia NINJA. (2)

Ocupação junto das árvores cortadas pela Tenda S.A. Foto: Julia Dolce/Agência Pública. (3)

Ocupação junto das árvores cortadas pela Tenda S.A. Foto: Julia Dolce/Agência Pública. (3)

Ocupação Guarani nas Antenas no Pico do Jaraguá (4)

Ocupação Guarani nas Antenas no Pico do Jaraguá (4)

YVYPURA - O Jaraguá é Guarani

Crianças contam a Aldeia - Documentário sobre Aldeia Indígena do Pico do Jaraguá - SP - Projeto OCAP