Ilha dos Lençóis

Beatriz Tone

MA, Brasil

1°19'5" oeste e 44°52'49" sul.

Uma ilha, paisagem mutante entre marés, saberes tradicionais e destruição.

Publicado em
06/10/2022

Atualizado em
02/12/2022

A Reserva Extrativista (RESEX) Marinha de Cururupu, criada em 2004, abrange 187 mil hectares da Área de Proteção Ambiental das Reentrâncias Maranhenses e objetiva a preservação do bioma amazônico marinho costeiro. Desses, 107 mil hectares são áreas de mangue. Incluem-se as 12 comunidades tradicionais que a habitam, vivendo da pesca artesanal, agricultura e criação de animais para subsistência. Todo a RESEX pertence à União e somente os moradores das comunidades tradicionais têm permissão de uso e ocupação – não sem conflitos fundiários com agentes externos.

A comunidade Ilha dos Lençóis, a ilha dos albinos, a ilha encantada de Dom Sebastião, ocupa um mar de dunas móveis, paisagem mutante, belíssima. Ali a amplitude das marés é alta, um banco de areia surge e, horas depois, é submerso por até 8 metros de água. É quando o banco aparece que o rancho – construção compartilhada de apoio para quem pesca – vai sendo construído com matéria retirada do mangue e do apicum, matas de terra firme vizinhas aos manguezais. As casas, então, transitam: levitam na vastidão do mar, confundem-se com o mangue, integram-se com o mar de areia. 

Ainda resistem algumas técnicas de pesca artesanal – currau, muruada, puçá, zangaria – em meio ao avanço de modalidades de pesca predatória e da ação de atravessadores que usam de mecanismos de endividamento, estabelecendo uma relação de trabalho análoga ao escravo com os pescadores.

A RESEX abriga também um estaleiro onde se constroem com esmero diversos tipos de embarcações tradicionais. Os barcos são cuidadosamente preservados pelos pescadores, coloridos, exibindo suas velas, flutuam no mar e pousam na lama quando a maré baixa. 

As crianças desenham barcos, vivem livres. Entre malabarismos no cajueiro, um gole de água fresca do poço, a correria pelas dunas, o mergulho nos braços de mar e banquetes de murici. Até o machismo arraigado destinar cada qual para seu papel: homens vão pescar, mulheres ter e cuidar de filhos, dos afazeres domésticos e pescar, jornadas múltiplas de trabalho.

Tanto o manejo da mata de mangue e de apicum, utilizada para diversas construções, quanto o manejo das águas, fonte de alimentos, foi desenvolvido pela população local. A frequência de nomes indígenas sinaliza que a cultura da pesca, do navegar e da vida em terra firme mescla saberes diferentes e seculares, alguns desses em risco. 

Faltam educadores nas escolas, profissionais de saúde, saneamento básico, coleta e tratamento adequado dos resíduos sólidos. O lixo cresce com as ideias de civilização que chegam por barco, satélite e wifi. Mais lixo também vem de longe com correntezas transcontinentais, colorindo tragicamente água e areia. 

Impossível passar uns dias nesse outro mundo sem notar que a crise avança ali. Como também sem notar as frequentes revoadas que ainda vêm e vão: guarás, garças brancas, garças morenas, japós, socós, saca-trapos, maçaricos reais, patos mergulhões. São 187 mil hectares prenhes de vida e de morte, de conflitos e coexistências. Como em tantos outros lugares dos mais de 851 milhões de hectares do território que veio a ser chamado de Brasil.

Foto: Beatriz Tone

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