Cidadela

Joana Martins, Ana Luiza Nobre e David Sperling

Vaseux, Haiti

19°34'24" leste e 72°14'36" sul.

Expressão arquitetônica máxima do processo que começou com a Revolução Haitiana, em 1791, e resultou na primeira abolição da escravidão do Ocidente, na primeira independência das Américas e na criação da primeira República Negra independente do planeta.

Publicado em
22/09/2022

Atualizado em
02/12/2022

A ilha onde hoje está o Haiti, no mar do Caribe, América Central, foi colonizada por Cristõvão Colombo ainda no século XV. Já no século seguinte, quase toda a população autóctone havia sido morta ou escravizada e a metade oeste da ilha foi cedida aos franceses, recebendo o nome de São Domingos. Os franceses trouxeram escravizados da África para trabalhar na produção de açúcar, café e cacau, tornando essa a sua colônia mais próspera.

Em 1791, escravizados nascidos na África – inferiorizados na hierarquia social, se comparados com os mulatos, ainda que representassem a enorme maioria da população local – se revoltaram e tomaram parte da ilha. Mataram e torturaram brancos, queimaram plantações e engenhos. Até garantir direitos para as pessoas negras e a abolição da escravidão, em 1793. As tropas napoleônicas foram vencidas dez anos depois e a ilha foi declarada independente e renomeada de Haiti – sua denominação indígena – em 1804, tornando-se o primeiro país livre da América Latina e a primeira república negra do planeta.

Além de ter sido a primeira nação a abolir a escravidão no ocidente, o Haiti é também a única nação cuja independência foi obtida a partir de um levante de escravizados e libertos. Essas vitórias incentivaram outras insurgências e assombraram escravocratas em todo o mundo, vindo a acelerar processos de emancipação (caso dos Estados Unidos e de Cuba) ou acirrar a repressão e o controle sobre os escravizados (caso do Brasil).

Para proteger a liberdade duramente conquistada, Henri Christophe, um ex-escravizado revolucionário que posteriormente se tornaria rei do Haiti, comandou a construção, entre 1805 e 1820, de um grande forte no topo do morro Bonnet à l’Evêque, ao norte da ilha. A Citadelle Laferrière, conhecida como Cidadela, foi erguida por milhares de ex-escravizados em um ponto e cota estratégicos, a 950 metros de altitude, para defender a ilha. Com 10.000 m², muralhas de 40 metros de altura, e projetada para estocar água e alimentos para até 5.000 pessoas por um ano, a Cidadela tornou-se símbolo da independência haitiana e foi declarada Patrimônio Mundial pela UNESCO em 1982.

E a maior fortificação das Américas segue sendo desafiada por forças diversas. Além de ser o país economicamente mais pobre das Américas e um dos últimos na lista do Índice de Desenvolvimento Humano, o Haiti está localizado em uma área de grande instabilidade tectônica, o que gera constantes movimentações de terra. Em 2010 e 2021, dois terremotos destruíram a ilha e deixaram milhares de mortos. A Cidadela resistiu, como tem resistido o Haiti há séculos.

(1)

(1)

Foto Anton Lau. (2)

Foto Anton Lau. (2)

Balas de canhão remanescentes na Cidadela. Foto Anton Lau. (3)

Balas de canhão remanescentes na Cidadela. Foto Anton Lau. (3)

‘’Vista de um Templo eregido pelos Pretos para comemorar sua Emancipação’’. Ilustração presente no livro ‘’An historical account of the black empire of Hayti: comprehending a view of the principal transactions in the revolution of Saint Domingo; with its antient and modern state’’, de Marcus Rainford, publicado em 1805. (4)

‘’Vista de um Templo eregido pelos Pretos para comemorar sua Emancipação’’. Ilustração presente no livro ‘’An historical account of the black empire of Hayti: comprehending a view of the principal transactions in the revolution of Saint Domingo; with its antient and modern state’’, de Marcus Rainford, publicado em 1805. (4)

‘’O Modo de exterminar o Exército Preto praticado pelos Franceses. Ilustração presente no livro ‘’An historical account of the black empire of Hayti: comprehending a view of the principal transactions in the revolution of Saint Domingo; with its antient and modern state’’, de Marcus Rainford, publicado em 1805. (5)

‘’O Modo de exterminar o Exército Preto praticado pelos Franceses. Ilustração presente no livro ‘’An historical account of the black empire of Hayti: comprehending a view of the principal transactions in the revolution of Saint Domingo; with its antient and modern state’’, de Marcus Rainford, publicado em 1805. (5)

Henri Christophe, rei do Haiti, gravura de Blasius Höfel, séc XIX (6)

Henri Christophe, rei do Haiti, gravura de Blasius Höfel, séc XIX (6)

Planta baixa da Cidadela, disponível no local hoje. Fonte: Wikimedia. (7)

Planta baixa da Cidadela, disponível no local hoje. Fonte: Wikimedia. (7)