Capela da Casa Grande
Joana Martins, Ana Luiza Nobre e David Sperling
Publicado em
22/09/2022
Atualizado em
02/12/2022
No alto de um morro às margens do Atlântico, em Luanda, uma casa branca e austera materializa as perversas relações entre a Igreja católica e a lógica colonial.
A casa pertenceu a um mercador de escravizados no século XVIII e serviu como entreposto para o comércio negreiro.
Após longa e sofrida travessia pelo interior da então colônia portuguesa, milhares de negros e negras capturados subiam a longa escadaria que levava à casa, de onde era possível ver a imensidão do mar e da viagem que os aguardava.
Mas antes de adentrarem os porões dos navios negreiros passavam pela capela da casa, onde eram convertidos à força ao catolicismo. A água benta que banhava seus corpos desnutridos e violados purificava suas almas de suas crenças profanas e os preparava para uma nova vida. Agora sim, poderiam cruzar o oceano, portando uma nova fé e carregando a culpa católica, tão celestial.
Em 1977, Angola, já independente, fez da casa de horrores seu Museu Nacional da Escravatura. Rodeada por baobás, a casa abriga agora a história dos que ali sofreram a primeira violação simbólica, na pia batismal.
Muitas outras casas como essas foram erguidas ao redor do Atlântico Negro. Que a arquitetura dessas construções inclua com frequência uma capela indica como o batismo imposto aos corpos negros foi mais uma forma sistemática de dominação, religiosa e subjetiva, a reforçar a experiência brutal de desterritorialização radicada no que chamamos hoje de Brasil – destino de pelo menos 40% do total de africanos transportados através do Atlântico entre os séculos XV e XIX.
Referências
Museu Nacional da Escravatura. Disponível em: https://welcometoangola.co.ao/directorio/museu-nacional-da-escravatura/. Acesso em: 21 jul. 2022.
PIMENTA, Fernando Tavares. Políticas de classificação do patrimônio histórico-cultural e museologia em Angola: O legado colonial. Projeto História, São Paulo, v. 62, p. 146-199, maio 2018. Disponível em: https://revistas.pucsp.br/index.php/revph/article/view/35927. Acesso em: 21 jul. 2022.
Fonte das Imagens
Imagem 1: https://pt.wikipedia.org/wiki/Ifig%C3%AAnia_da_Eti%C3%B3pia
Imagem 2: https://revistapesquisa.fapesp.br/wp-content/uploads/2001/11/93_hist%C3%B3ria.pdf
Imagem 3: https://revistapesquisa.fapesp.br/wp-content/uploads/2001/11/93_hist%C3%B3ria.pdf