Sara Cura
Atlas do Chão
Publicado em
04/07/2024
Atualizado em
19/07/2024
Constelação desenhada no âmbito do projeto “De-Saracura”, destinado a mapear relações multiespécies germinantes na comunidade ribeirinha do Rio Saracura, soterrado sob o asfalto do Bixiga, região central da cidade de São Paulo.
O projeto vincula-se à iniciativa South Designs “Desenhar com o Planeta. Conectando zonas ribeirinhas de luta em São Paulo, Jacarta e Berlim” (coordenação Laura Kemmer e Jamie Scott-Baxter), com vistas a des-colonizar / des-enterrar / des-tampar histórias e memórias da comunidade ribeirinha local, constituída por múltiplas espécies, seres visíveis e invisíveis, humanos e não humanos que em diferentes escalas, espaços e temporalidades convivem num território fortemente marcado pela presença negra e com vestígios também da presença indígena.
Com o objetivo de mapear e fomentar práticas socioespaciais, saberes e fazeres locais, bem como vestígios de resistência que se contrapõem aos violentos processos de urbanização extensiva que vêm ameaçando a vitalidade histórica dessa região, um grupo de cerca de 30 pesquisadores, estudantes universitáries, agentes comunitaries, indígenas dos povos Baniwa, Baré e Dessano, quilombolas e artistas reuniu-se entre 2 e 7 de outubro de 2023 na oficina de contracartografia Sara Cura, concebida e coordenada pela equipe do Atlas do Chão (Ana Luiza Nobre e David Sperling).
A oficina promoveu trocas entre representantes de movimentos sociais locais com parceires de zonas ribeirinhas de luta do Salve Saracura de São Paulo, do Labtek Apung Jacarta e da Floating University de Berlim, e contou com a participação da artista brasileira Maria Thereza Alves, cuja obra política-poética (em especial o trabalho “Seeds of Change”) inspirou a construção de contranarrativas e práticas decolonizantes dentro de uma perspectiva profundamente conectada ao chão como ser vivente, arquivo vivo e base comunalizante.
A oficina foi realizada na Casa de Dona Yayá e na Galeria Jaqueline Martins e resultou na elaboração de 7 cartas ao rio Saracura, produzidas por grupos interdisciplinares e heterogêneos, formados pelo cruzamento de diversas nacionalidades, origens, idiomas e faixas etárias, incluindo um grupo de crianças.
Todas as etapas do trabalho foram discutidas e decididas coletivamente, a partir dos referenciais teórico-críticos e das formas de ação do Atlas do Chão, com ênfase em abordagens contracartográficas de viés ecopolítico-poético.
Fundamental, nesse sentido, foi o entendimento do Bixiga como um ecossistema dinâmico estruturado através de relações interescalares e moldado por formas de hipervisibilidade e invisibilidade, precariedade, violência epistemológica, silenciamento, trabalho, mas também por afetos, resistências, diversidade, confluências, cuidado.
As atividades foram encerradas com a leitura pública das cartas num ritual-performance coletivo realizado no Museu das Culturas Indígenas no âmbito do simpósio “Leituras de sedimentos”, organizado por Laura Kemmer (Cátedra von Martius, DAAD-USP) com a participação de representantes locais do território do Bixiga-Saracura e convidades de zonas ribeirinhas solidárias de Berlim, Jacarta, Buenos Aires e São Paulo.
Os eventos receberam financiamento da Cátedra Martius (financiada pelo DAAD com fundos do Ministério Alemão dos Negócios Estrangeiros), da South Designs Initiative (Swiss National Science Foundation) e do Instituto Goethe São Paulo, além de apoio da Casa da Dona Yayá/CPC-USP, Galeria Jaqueline Martins e SESC CPF.
Pontos:
Oxum vive
Na memória vive um rio
A amorinha-do-brejo também brotou
O que não sabemos
Fala, Saracura!
Você caminho, eu aquático
2 rios e 4 milhões de passos
Com textos de:
Alexandre Silveira, Ana Carolina Bezerra, Arianna Mattietti, Camila Alba, Carla Lombardo, Claudilene Pedrosa Caldas, Endira Julianda, Daniel Lavinas, Gabriela López, Gabriela Sad, Jacinto Donizeti dos Santos, Joana Martins, Julia Reis, Julia Sanches Pereira, Juarez Lopez, Ж, Lau Pessoa, Luis Gabriel Ferreira da Silva, Maria Thereza Alves, Mariana Parmanhani, Martha Hitner, Neide Antunes de Sá, Raphaël Maureau, Rosseline Tavares, Teresa Huppertz, Sileia Massa Alves, Solange Lisboa, Ute Lindenbeck, Vanessa Chacur Politano, Victor Stout, Victor Vaccari, Vitória Serafim.
Agradecimentos:
Somos grates a todes que nos receberam em suas casas, terreiros e espaços, nos deram de comer, nos guiaram pelos meandros do Bixiga, compartilharam suas memórias, sonhos e imagens, discutiram e desenharam conosco esta constelação dos seres-rios do Bixiga: Associação Mulheres Unidas Venceremos (Romilda Correia e equipe), Casa da Dona Yayá/CPC-USP (Flávia Brito do Nascimento e equipe), Horta Comunitária do Bixiga (Romilda Correia, Jacinto Donizetti e equipe), Ilê Asé Ya Osun (Mãe Jennifer e equipe), Mobilização Saracura Vai-Vai (José Adão de Oliveira, Marco Ribeiro, Minoru Naruto, Solange Pereira de Sant Ana, Vera Campos,Raphael Borges Moreau), Salve Saracura (Carla Lombardo, Claudia Muniz, Ж, Luis Michel Françoso, Nina Neves, Victor Próspero, Rafael Funari, Solange Lisboa) e Teatro Oficina (Cafira Zoé e Marília de Oliveira Cavalheiro Gallmeister).
Estendemos nossos agradecimentos a Laura Kemmer e Jamie Scott-Baxter, (South Designs Initiative, Swiss National Science Foundation) e Cátedra Martius/USP-DAAD), Instituto Goethe São Paulo (Débora Pill, Renate Heilmeier, Tatjana Lorenz), Casa da Dona Yayá/CPC-USP, Galeria Jaqueline Martins, Lúcio Teles, Museu das Culturas Indígenas, SESC CPF e SESC 14 Bis, por todo o apoio que recebemos.
Agradecemos também às ribeirinhas solidárias da Floating University Berlim (Ute Lindenbeck e Teresa Huppertz) e Labtek Apung Jacarta (Endira Julianda), e à Lisa Diedrich (Gropius Chair, UBA-DAAD) e Maria Jesús Huarte pela participação e valiosos comentários durante o Simpósio “Leituras de Sedimentos“.
Obrigada ainda a Azri Pessoa pela revisão de gênero em Português, e traduções Inglês-Português. A Arianna Mattietti pela tradução Português-Italiano, a Gamal & Hana Bargal el Hamrawy pela tradução Alemão-Árabe, e a Laura Kemmer pelas traduções Português-Alemão.