Tratado de Tordesilhas

Eleonora Aronis, Ana Luiza Nobre, David Sperling

Tordesillas, CL, Espanha

41°29'59" leste e 5°0'4" sul.

“O Brasil é um grilo de seis milhões de quilômetros talhado em Tordesilhas.” (Oswald de Andrade, Revista de Antropofagia 5, 1928)

Publicado em
18/09/2022

Atualizado em
18/09/2022

“E outrossim vos damos o dito poder para que em nosso nome, e de nossos herdeiros e sucessores de nossos reinos e senhorios, súbditos e naturais deles, possais concordar, e assentar, e receber e aceitar do dito rei de Portugal e dos ditos seus embaixadores e procuradores em seu nome, que todos os mares, ilhas e terras que forem e estiverem dentro da limitação e demarcação de costas mares e ilhas e terras que quedarem, e ficarem com nós e com nossos sucessores, para que sejam nossos e de nosso senhorio e conquista, e assim de nossos reinos e sucessores deles, com aquelas limitações e excepções e com todalas outras cláusulas e declarações que a nós outros bem visto for. E para que sobre tudo o que dito é e para cada uma cousa e parte dela, e sobre o elo tocante ou dela dependente, ou a elo anexo e conexo em qualquer maneira, possais fazer e outorgar, concordar, tratar e receber e a aceitar em nosso nome e dos ditos nossos herdeiros e sucessores, e de todos nossos reinos e senhorios, súbditos e naturais deles, quaisquer capitulações, contratos e escrituras com quaisquer vínculos, actos, modos, condições, e obrigações e estipulações, penas e submissões, e enunciações que vós outros quiserdes e bem visto vos for.” (Tratado de Tordesilhas, Folio 1v)

Em 1494, no dia sete de junho, na cidade de Tordesilhas, na Península Ibérica, foi assinado um tratado que dividia o mundo ao meio. A partir de uma linha reta traçada ao longo de um meridiano, que ia do Polo Sul ao Polo Norte, a 370 léguas a oeste da Ilha de Santo Antão no Arquipélago de Cabo Verde, na África, as terras do chamado Novo Mundo foram divididas entre as duas potências européias. A parte oriental para Portugal e a parte ocidental para a Espanha.

A reta traçada em Tordesilhas se tratava de uma linha virtual sobre um território até então pouco conhecido e mapeado pelos colonizadores. E, dentre as várias marcações, as linhas de Cantinho (1502), Pedro Nunes (1537) e Luís Teixeira (1574) não desenhavam, de fato, meridianos; a cartografia, enquanto ciência, ainda estava em gestação. 

Mesmo falhos e diante do desconhecido, os mapas se assenhoram de certezas para criar novas realidades. 

Monumentos feitos de pedra e brasão, fincados no chão, ainda são testemunhas de onde se aterrou a linha – não tão reta – do pretendido meridiano, em Belém do Pará, no norte do Brasil, em Cananéia, no sul do estado de São Paulo e em Laguna, Santa Catarina.

Em paralelo às disputas dos mapas, corriam as disputas no território – sempre querendo tudo o que havia nesses chãos. Sob as linhas da retificação e da posse, foram colocadas tantas outras linhas, fluídas, cheias de vida. Populações e seus saberes ancestrais, animais e florestas, rios e minérios. 

Definitivamente, o território não é o mapa. E o mapa não é o território. 

Terra incognita. Insanis mappa.

Marco do Itacuruçá - Ilha do Cardoso - Cananéia – SP (1)

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Mapa do Brasil que tem origem no Atlas Português de 1519, conhecido como Atlas Miller. Original na Biblioteca Nacional da França. (2)

Mapa do Brasil que tem origem no Atlas Português de 1519, conhecido como Atlas Miller. Original na Biblioteca Nacional da França. (2)

Versões do Meridiano de Tordesilhas sobre um mapa político atual da América do Sul (mapa em projeção conforme, com meridianos em paralelo) . (3)

Versões do Meridiano de Tordesilhas sobre um mapa político atual da América do Sul (mapa em projeção conforme, com meridianos em paralelo) . (3)

Francis Alÿs, The Green Line, Jerusalém (2004) Documentação em vídeo de uma ação. Cortesia de David Zwirner, Nova York.  (4)

Francis Alÿs, The Green Line, Jerusalém (2004) Documentação em vídeo de uma ação. Cortesia de David Zwirner, Nova York. (4)

Desmatamento não é desenvolvimento. (5)

Desmatamento não é desenvolvimento. (5)

0º00 Navigation Part II: A Journey Across Europe and Africa de Simon Fiel, é a segunda de duas jornadas épicas e quixotescas que traçam a linha 0° de longitude em todo o planeta. (6)

0º00 Navigation Part II: A Journey Across Europe and Africa de Simon Fiel, é a segunda de duas jornadas épicas e quixotescas que traçam a linha 0° de longitude em todo o planeta. (6)

No ano de 1493, o Papa Alexandre VI aditou a bula que causou a maior polêmica entre Portugal e Espanha / Arquivo GB Imagem. (7)

No ano de 1493, o Papa Alexandre VI aditou a bula que causou a maior polêmica entre Portugal e Espanha / Arquivo GB Imagem. (7)

Francis Alÿs The Greenline